Friday, November 03, 2006


Orgasmo Carlos (o autêntico, o original, o etc e tal), o único heteróinimo de homónimos existente para já neste planeta (a pastichar-clonar no futuro!), escreveu um comentário sagrado (mais sagrado que o banal original) sobre essa treta-flirt das pseudo-anonimísses, assim como fez valentes reparos à minha crítica moderada (sim! nem mesmo as minhas cautelas nietzschianas são poupadas!). Salvé grande Orgasmo! E aqui vai a jactante prosa:



Não me parece q o anoni-masturbacionismo retire nem o espectro da carreira nem a densidade psicológica (a densidade do esperma inhumano), nem que o onani-mato seja um crime ou faça cegar. Faz cagar? Seja isso o que for, o rótulo não é assim tão importante, a não ser que sejam peças que vivam desse jogo, e sendo assim, são denunciadas pelo mesmo, tipo "o rei vai nu" como diz o nosso bom cavalheiro. A obra é ou não boa em termos absolutos. O que é absoluto? Não sei, mas que existe, existe. O contexto apenas abre novas possibilidades e, nisto tudo, a velha merda da imaginação (o rapaz tem jeitinho, tem muita imaginação), ainda vale o que vale (pouco, mas eu gosto) Retira isso sim uma pista para mais do que uma pista. Soma e multiplica. È um artificio, aliás um fogacho de artifício. Talvez seja tesão, Talvez seja ódio mortal, é qualquer coisa ou coisa nenhuma. Deve-se também acrescentar que os autores/actores acumulam a sua produção heteronímica com a normal e, na verdade, quanto mais melhor. Quanto ao ressentimento, quem não se ressente não é filho de boa gente. Quanto ao cómico, eis a verdadeira tragédia.Um peido não pode ser traduzido nem em braille nem em necessidade de fazer justiça. Os verdadeiros justiceiros da arte são um e só um e o seu nome é Orgasmo Carlos. Ele é um artista real, não um conjunto de conspiradores mais ou menos intelectuais. Ele é a alma e a arma dos povos português e venuzuelano, emfim, a casca de fora da cebola. Emfim, somos terroristas que não encontraram ainda as suas torres gémeas, Picassos nascidos no Corvo, Stravinskis do minete, tudo isso, mas não estamos completamente mortos e as camisas de forças não nos ficam bem. Vítimas da moda?

Saturday, October 28, 2006


HETEROMNIBUS ARTISTS – para a criação de um des-status comicus-cognitivus


Os «artistas» heteromnibus (os que se dão bem com uma autoria fluída (famosa ou não), com o falso anonimato, com a entre-autoria, etc.) desejam, não dar cabo do satus quo («acabar» com o status quo é reforçá-lo maléficamente), mas criar um «des-status comicus-cognitivus».

É certo que os circuitos do art world são atalhos canalhas, mas haverá verdadeira vantagem, sem invejas, em substituir abruptos circuitos de legitimação e fama por qualquer coisa mais razoável, púdica e sentenciosa? Há uma ressentida vontade em fazer justiça e questionar as acostumadas autorias. Sentido que não subscrevemos de um modo militante, mas que recomendamos, sem ressentimentos, de um modo diletante. A solução é, pois claro, a pseudonomia, a heteronomia e outras modos de desenrascar o sujeito de uma subjectividade demasiado taxativa e obsoleta. São sobretudo os artistas mais famosos que se querem ver livres das chatices a que acostumaram as suas claques e os seus denegridores. O aborrecido périplo da fama condena-os a uma rotina de aeroportos e tediosos jantares nas caves melancólicas dos museus. Deixaram há muito de arriscar e têm saudades dos primeiros passos de carreira onde tudo era permitido e a juventude era louca. A opção por um «estilo» é, à luz do bom velho Aristóteles, uma redução de potência (da dynamis), por maior que seja o acréscimo de qualidade.

A anonimidade de um artista, ou de um enorme número de artistas, apenas retira o espectro da carreira e a densidade psicológica às obras. Desinfesta o mercado da especulação? Não, o mercado também comercializa bem anonimisses de merda. A interface que se establece entre a aparência das obras (formal?) e o rizoma teórico-literário-biográfico são aborrecidamente suspendidos. Ganhamos algo com isso? Em muitos casos é possivel, porque desconstrói a burocracia das legitimações e os circulos viciosos a que as obras e carreiras dos artistas parecem absurdamente condenadas. Mas em boa parte perde-se o sumo que faz fervilhar a vida na arte e nas suas obras – a maliciosa luta de poder e de marcação de território com as anedotas (de sanita) em anexo (falta-nos um Vasari ainda mais cínico, no sentido kunico, para escrever uma boa história das artes modernas ou muito mais do que isso!).

Mas um crítico sério sabe que os artistas não estão sós, e que as diversas networks no art world é que contextualizam determinados vícios – essas networks são bem mais anonimas do que as marcas que comercializam. A supressão da autoria tornaria os ready-mades irrelevantes, ou menos histéricos? A questão não está na fama, na autoria, ou no seu cabotino disfarce, mas em perceber se fazemos arte para alimentar cínicamente (no sentido não kunico) um sistema que cada vez é mais uma contestação de determinas regras fantasmagóricas e menos uma experiência, subjectiva ou não, de libertação de restrições pessoais, comunitárias e por aí além.

Interessa-nos menos a autonomia do espectador, enquanto passivo crítico, do que a sua participação activa num devir comico-cognitivo.

No futuro deveria ser irrelevante se somos ou não mais famosos, desde que sejamos melhores nas nossas competências, na complexidade e na qualidade. A linguagem, por si só, não nos salva. A implosão da linguagem não nos redime dos falsos pecados e do fedor de fundo, por mais que nos enamoremos da sua dissolução, como dizia Borges, entusiasmados (hipotéticamente & ruidosamente) com o seu desaparecimento. O silêncio e a autodestruição satisfazem as mentes apocalipticas. A nós nada.




Desde há muito tempo que as supostas metalinguagens da arte, sejam artísticas, sejam parte do medium, se autocanibalizam na impotência de uma autodestruição efectiva, deleitando-se em encenações supostamente «radicais». O sentimento apocaliptico é apenas o condimento que serve para atulhar museus de mercadorias cada vez mais abjectas. Simultaneamente é produzida uma literatura tremendamente aborrecida, e maioritáriamente sem sequer ponta sequer de originalidade.

Imaginar que há uma percepção estética que se aprimora para lá da prótese dos nomes a que estão vinculadas as obras é ser naif. Nenhum caos poderá ser gerado a partir de semelhantes brincadeiras de «desenquadramento» - as vigilantes brigadas revolucionárias das velhas tradições vanguardistas que sobrevivem à custa da florescente industria museológica, rápidamente recuperam, seja de que maneira for, qualquer ímpeto que questione realmente o que se faz passar por arte.

Em arte, ao contrário da lógica, é raro os contrários excluírem-se, mas também pode acontecer. O rápido consumo dos mestres mais publicitados por parte das instituições mais agressivas (ou não) abre o apetite por «mestres desconhecidos» que possam dar fama a curadores astutos e rescrever a história através de linhas cada vez mais tortas e descozidas – o que é bom para o entediado público que somos todos nós! O apetite surrealista pelos aspectos obscuros de um artista ou por «falhados» e outros marginais tem vindo a tornar o coleccionismo (privado ou público)algo parecido com wunderkammer em que já é difícil maravilharmo-nos com algo.

Ao contrário do que profetizara Benjamim, os meios de reprodução técnica e digital apenas contribuiram para reforçar a aura de imagens, sobretudo as mais suspeitas de algo enigmático (como a Mona Lisa ou as obras de Duchamp). É certo que a fama se democratizou ao ponto de dar ao banal uma difusão e um poder com o qual não queremos pactuar. Mas a posteridade, esperança filtradora de artistas como Duchamp, embora continue a lançar para o esquecimento coisas às toneladas, também está continuamente a proceder às mais extravagantes repescagens. Amanhã seremos todos esquecidos... mas também seremos episódicamente rememorados.

Saturday, October 21, 2006



Há quem tenha uma autentica vontade interpretativa - eu, como todos os gajos com faro, apenas me limito a olhar de soslaio, como um expert matador. Vi a recente exposição de arte americana em Londres e faltou-me a vontade para o comentário. Não gosto muito de arte antiga, mas por vezes desintoxica. Apetece-me, assim de repente, ter à frente um bom bocado de arte que seja carne, como a ewscultura grega do ínicio do século V a.c.. Ponho-me a questionar as teses de Macluhan, e pergunto-me se não há um raio de apetite visual algo arcaico e terrivelmente pré-histórico que, para lá das nossas adaptações aos devires environmentais (e o environment é físicamente uma mentalidade)nos torna um pouco reticentes a esta diversidade temas tão estupidamente actuais. Há na exposição algo implosivo e catastrofista em quase tudo.




Eu sei que desta desordem nascerão novos e arrepiantes mestres com gloriosa carreira e prestigio clássico, mas falta aqui uma clareza conceptual para lá dos velhos clichés já velhotes do apropriacionismo. É difícil ser um «novo» artista hoje? É esse o interesse do desafio. A história será mais uma vez catastrofista e cinicamente impiedosa.

Friday, October 20, 2006

É òbvio que o meu nome não é James Jauss... pensava, pois claro, no inalienável e alienante James Joyce, mas acudiu-me o apelido do teórico «recepcionista» que nunca li, e que em nada venero, mas que por ser «recepcionista» é quase emblemático desta minha actividade horrivelmente autobiográfica e furiosamente crítica. A minha vida reduz-se a forjar actos críticos, de preferência demolidores.

Esses actos constituem-me, pôe-me em devir, vão-me transformando não sei se num tipo horrivel e rabugento se num temível arrasador de mediocridades culturais como o foram Thomas Bernard ou o Karl Kraus (ò horrenda Austria!). Mas ao contrário de Kraus não tenho pretensões em reformar o que se passa na minha terrinha (adeus, ó inúteis debates e intrigas canalhas!). Penso ter como alvos críticos os big masters do provincianismo desta aldeia global. O velho pretensiosismo do cosmopolita, o dandy (no fundo um bimbo!) que viajava e disfrutava de uma cultura de difícil acesso é coisa do passado.



O art world, como qualquer outro mundo profissional, provincianizou-se a um ponto tal que é impossivel não saber quem é quem com uma displicência bairrista. Fala-se e escreve-se, é claro, num pseudo-inglês. O antigo cosmopolita vangloriava-se de ser poliglota (como Joyce) e os mundos das artes regiam-se por multiplicidades canónicas regionais. Hoje, por mais que se seja pluralista só há práticamente um canone único de arte com uma história ao qual os artistas submissamente se referem. Caramba! Os limites da arte parecem ter sido esticados. Um bom exemplo foi a famosa merda de artista, devidamente enlatada, industrializada e cotada nos melhores mercados de arte. Mas o que é esta merda comparada com a deliciosa e eficaz merda dos Dalai Lama, o melhor medicamente do dominio do budismo tibetano? A piada de Manzoni é uma suave graçola histórica e tem horriveis sucessores, como é o caso da merdosa vida refeita em obra, e mumificada por instituições ditatoriais (como é o caso de Saatchi e o seu gang!), da Tracey Emin. Há quem lhe queira lamber o cú? Não faço ideia, mas é um bom passaporte para a imortalização na cada vez mais patética história de arte. Arrivederci!